“Antes de entrar em um relacionamento, busque se conhecer melhor

14/04/2024


Por Andréa Moura

A influência das redes sociais no cotidiano da população, especialmente no comportamento dos mais jovens, tem crescido cada dia mais, e preocupado pais e especialistas ao redor do mundo. Quando bem utilizadas, as redes sociais são fonte de informação saudável e de socialização. Porém, o outro lado também existe, e é nesse mundo ao avesso, e “vendido” como correto e saudável, que mora o perigo. Uma das tendências recentes em uma famosa rede social, é o compartilhamento de vídeos feitos por jovens e adolescentes relatando que fizeram uso do medicamento dipirona para curar a dor emocional causada pelo fim de relacionamentos.

Indicado para combater dor, febre e cólica, esse medicamento é um dos 10 mais vendidos no Brasil anualmente, e de acordo com dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no ano de 2022 foram vendidas no país mais de 200 milhões de doses, e um ponto que contribui imensamente para esse número é o fato de não haver necessidade de prescrição médica para a venda.

Embora extremamente liberada em território brasileiro, a dipirona passou a ser persona non grata em cerca de 30 países no mundo, de onde foi banida, a exemplo dos Estados Unidos, Japão, Austrália, Inglaterra e Colômbia. O motivo? Estudo científico da década de 1960, alegando que a dipirona oferece riscos de causar agranulocitose, condição que reduz no sangue as células de defesa e prejudica o sistema imunológico, uma condição rara, mas que pode ser fatal.

E por causa desse comportamento, no mínimo, inusitado que muitos jovens estão tendo, de querer curar “mal de amor” com dipirona, decidimos conversar com a psicóloga Érika Chagas, especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica, Psicóloga Perita Examinadora de Trânsito, e que atua na área clínica com a abordagem da Terapia Cognitiva-Comportamental (TCC), para que ela nos fale, à luz da Psicologia, o que poderia estar desencadeando essa estranha onda.

PRA VOCÊ SABER - Érika, a gente sabe que as redes sociais, hoje em dia, têm ditado o comportamento de muitas pessoas, principalmente, dos jovens. Uma dessas influências tem sido o uso do medicamento dipirona como cura para a dor emocional causada por término de relacionamento afetivo. Isso ajuda?

ÉRIKA CHAGAS - As redes sociais, assim como qualquer ferramenta, precisam ser utilizadas de forma adequada. Também questiono sobre a maturidade dos jovens para uso das redes sociais de forma coerente, tanto no sentido de utilizar/consumir conteúdo,  quanto de analisá-los, uma vez que a influência da imagem exerce certo poder na vida das pessoas, desperta desejo,  interesse e cria necessidades que nem todos conseguem filtrar. Quanto ao uso de medicamentos, sem orientação médica já não é recomendado, imagine utilizar para tratar algo que está totalmente fora de alcance, a exemplo da dipirona para questões emocionais. Totalmente fora de cogitação. O que de fato ajuda nesse contexto é ter apoio familiar e trabalhar, através de ajuda profissional, as questões emocionais que estiverem fora de controle, afinal, frustrações são processos normais na vida de qualquer pessoa, e embora não seja fácil, é totalmente possível lidar com elas.

PVS – Esse comportamento poderia ser enquadrado como dor, ou síndrome do coração partido? Como ela pode afetar a saúde física da pessoa?

EC - Segundo o Ministério da Saúde, a síndrome do coração partido é considerada um problema raro, de origem psicológica, que provoca sintomas semelhantes aos de um infarto, como dor  no peito, falta de ar ou cansaço. Tendem a se apresentar em períodos de grande estresse emocional, seja por fatores ambientais ou psicológicos aos quais o sujeito é exposto. Porém,  independente da origem ou causa, a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental, que é a abordagem com a qual atuo, tem se mostrado extremamente eficaz,  direcionando o paciente ao autoconhecimento e controle das emoções, através das diferentes técnicas e manejo terapêutico para a prevenção e tratamento dessa demanda.

PVS - Não seria muito cedo para uma adolescente com idade entre 13 e 16 anos, por exemplo, amplificar a dor psicológica do término de um relacionamento?

EC - Cada ser humano é único e tende a reagir, sentir e construir percepção de mundo de acordo com os conhecimentos transmitidos e experiências vividas. Então, a idade, por si só não irá determinar a ocorrência ou não da dor emocional,  mas sim o conjunto de fatores atrelados ao histórico pessoal de cada indivíduo.

      Também questiono sobre a maturidade dos jovens para o uso das redes sociais de forma            coerente, tanto no sentido de utilizar/consumir conteúdo, quanto de analisá-los

PVS - Aliás, nesta idade, já existe maturidade suficiente para que os jovens namorem?

EC - Idade e maturidade são muito relativos. As vivências e experiências tendem a ser muito mais determinantes nesses aspectos do ser. Apesar de avaliarmos a média geral dos jovens nessa faixa etária como imaturos demais para viver determinadas experiências, e que de fato, muitos ainda são imaturos nos comportamentos que têm diante de determinados contextos, ainda assim é necessária uma avaliação mais completa para compreender a situação e o posicionamento do jovem diante dela. E claro, ter uma base familiar presente e que acompanhe o processo também se faz importante e necessária, pois tende a prevenir grandes transtornos e crises emocionais.

PVS – Essa “dor de amor” é mais complexa de tratar em jovens, ainda mais os dessa nova geração? Se sim, por quê?

EC - Costumo dizer sempre que amo trabalhar com jovens pela capacidade e potencial em aceitar e realizar as mudanças em prol do bem-estar deles, e das pessoas em seu entorno. Por esse motivo, percebo a facilidade que os jovens têm para aprender e modificar situações de estresse e desadaptativas. Em relação à nova geração em si, algumas vezes aparecem questionamentos por causa do amplo e facilitado acesso à informação, que permite o espelhamento do "porque não sou assim, ou comigo é diferente?" Mas nada que um bom manejo terapêutico não consiga ajustar ou responder junto com esses jovens.

PVS - Como tratar essa situação da “dor de amor” em adultos?

EC - Em adultos, gosto de começar a psicoterapia com um processo de anamnese, para relembrar e observar a própria história e como ela foi construída, ressignificando as dores e traumas, trazendo a percepção dos próprios comportamentos e mecanismos de defesa através da análise funcional dos comportamentos, fortalecendo a autoconfiança e autoestima, para então, construir novas possibilidades de ação/resposta diante de situações específicas. Além disso, também utilizo técnicas de relaxamento e percepção/controle das emoções. O conjunto das técnicas aplicadas, geralmente, traz rápidos resultados e grandes transformações na vida do sujeito. Sempre digo na terapia que cada passo importa.

PVS - A que sinais os pais ou responsáveis devem estar atentos para que essa “dor de amor” não cause problemas maiores?

EC – Geralmente, os sinais físicos são mais evidentes na maioria dos casos, porém os comportamentos também transmitem importantes informações e sinais de alerta. O ideal é que  família busque conversar, exercendo uma audiência compreensiva na tentativa de identificar o que há de errado ou diferente com o jovem. Claro que as mudanças na adolescência são comuns, porém, se a família perceber exagero ou incidência de algum sintoma ou comportamento específico que esteja destoante do contexto no qual o jovem se apresenta, é importante observar, conversar e intervir para evitar maiores danos à saúde psicológica, e buscar ajuda profissional sempre que necessário.

PVS - Se você pudesse dar três conselhos, genéricos mesmo, à luz da psicologia, sobre relacionamentos amorosos, quais seriam?

EC - Antes de entrar em um relacionamento busque se conhecer melhor e entender a raiz dos seus medos, ressignificar algum trauma caso haja, se perceber enquanto um ser humano e complexo. A partir dessa compreensão ficará muito mais fácil lidar com um relacionamento, pois provavelmente terá autoconhecimento suficiente para perceber os comportamentos ligados às suas próprias carências afetivas, bem como necessidades de aceitação, medos e inseguranças do outro. Isso ajudará a não agir, ou submeter-se a situação de dependência emocional, e até agressões do parceiro ou parceira.

PVS – Nos fale mais um pouco sobre você.

EC – Sou graduada em Psicologia Licenciatura e Bacharelado pela Universidade Tiradentes (Unit), especialista em Psicopedagogia Institucional e Clínica, e Psicóloga Perita Examinadora de Trânsito. Atuo como Psicóloga Clínica na realização de atendimentos psicoterápicos presencial e online para mulheres adultas, e também realizo avaliação psicotécnica, psicodiagnóstico, orientação vocacional e profissional, acompanhamento gestacional, entre outras demandas.

Na área clínica, trabalho com a abordagem da Terapia Cognitivo-Comportamental. Desde o início da minha atuação atendo, entre as várias demandas, os casos específicos referentes à ansiedade e transtornos de ansiedade, por isso me especializei no assunto, como forma de oferecer aos meus pacientes excelentes ferramentas, de acordo com as particularidades de cada um, aplicando técnicas específicas com o intuito de alcançar excelentes resultados que possibilitam mudanças significativas e transformações importantes na vida deles, em um curto espaço de tempo.

Possuo formação complementar em Psicologia Diferencial, Arteterapia para a prática clínica do Psicólogo, Psicologia Obstétrica e Psicoprofilaxia da Gravidez, Teoria Cognitivo-Comportamental, Desenvolvimento de Facilitadores de Processos, e Montagem do consultório Psicopedagógico. Realizo palestras nas áreas de conhecimento, e possuo trabalhos publicados e participação na organização de eventos na minha área de formação. Sou Instrutora de Educação Profissional do Senac/SE e docente no Núcleo de Pós-graduação no Curso de Psicopedagogia Institucional e Clínica, da Faculdade Amadeus, onde ministro a disciplina Teorias da Psicologia Aplicadas à Aprendizagem.



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